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19 / abr / 2020
UFMG planeja testar medicamento indicado para tratamento de feridas contra o coronavírus

Patente da substância já foi depositada; primeiras análises baseiam-se em pesquisa computacional

Micrografia eletrônica de varredura colorida de uma célula apoptótica (verde) fortemente infectada com partículas do novo coronavírus (laranja) isoladas de uma amostra de paciente. Foto: NIAID Integrated Research Facility (IRF)

A UFMG acaba de depositar o primeiro pedido de patente no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), com o objetivo de reposicionar um fármaco para a produção de medicamentos a serem usados no tratamento de pacientes infectados pelo coronavírus SARS-CoV-2, agente causador da Covid-19. Os pesquisadores Marcos Augusto dos Santos e Carmelina Figueiredo Vieira Leite, do Instituto de Ciências Exatas (ICEx), são os responsáveis pela recuperação do tetraclorodecaóxido (TCDO), que pode ser utilizado como único princípio ativo ou em associação com outros fármacos, preferencialmente antivirais.

Segundo Marcos dos Santos, quase todo medicamento já aprovado para tratar alguma doença apresenta algum tipo de efeito colateral. Assim, reposicionar um fármaco significa explorar esse efeito com finalidade terapêutica. “O viagra, por exemplo, surgiu de uma droga que inicialmente agia em doenças cardíacas e foi reposicionado para a disfunção erétil em razão do efeito colateral observado”, explica o professor.

O tetraclorodecaoxido foi desenvolvido pelo laboratório Oxo Chemie, da Suíça, como terapia adjuvante para combinar regimes antirretrovirais e profilaxia oportunista de infecções em pacientes com aids. A substância também já foi usada para testes clínicos com pacientes com câncer do colo do útero submetidos à radioterapia, e sua versão tópica é comercializada em muitos países para cicatrização de feridas, respaldada por sua ação anti-bactericida. O TCDO também foi proposto para tratamento de úlceras de pé diabético, e há perspectivas promissoras para o combate à doença pulmonar obstrutiva crônica. Nenhuma indicação, porém, está relacionada ao uso em pacientes infectados pelo novo coronavírus.

A substância foi escolhida pelos pesquisadores porque, com ela, foram recuperados outros quatro reposicionamentos, como o ácido benzoico, que está sendo testado como antiviral. “Os outros fármacos encontrados junto com o TCDO, que já estão sendo testados para o coronavírus, também são reposicionamentos. O único que não estava sendo testado era justamente o TCDO”, explica Marcos dos Santos.

Ganhando tempo
De acordo com Marcos dos Santos, uma grande vantagem do reposicionamento é o ganho de tempo, uma vez que a toxidade e tolerância ao fármaco já foram testadas. Essa particularidade torna a prática especialmente válida no momento em que há uma corrida mundial pela busca de terapias eficazes contra uma infecção de efeitos devastadores.

O fármaco tetraclorodecaoxido foi selecionado após testes in silico.  Esse tipo de análise, segundo o professor, utiliza mecanismos para recuperar os resultados de uma pesquisa de consulta de palavras únicas ou múltiplas em um banco de dados de documentos, introduzindo conceitos como indexação semântica latente (LSI), decomposição por valores singulares (SVD) e distância do cosseno/euclideana.

“Em outras palavras, a análise in silico se dá por meio de testes computacionais com base em modelos matemáticos”, resume Marcos dos Santos. Esse trabalho é feito no Laboratório de Bioinformática e Sistemas (LBS), do ICEx. “Em circunstâncias normais, faríamos testes in vitro [experimentos de bancada com reagentes e tubos de ensaio para verificar a capacidade de reação] antes de partirmos para essa abordagem”, ressalta o professor.

Próximos passos
De acordo com informações da Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica (CTIT) da UFMG, vários fármacos vêm sendo testados para o tratamento de pacientes infectados por SARS-CoV-2, como pirfenidona, ASC-09/ritonavir, darunavir, cobicistat, cloroquina, hidroxicloroquina, interferon beta, remdesivir, ritonavir, lopinavir, sarilumab, oseltamivir, arbidol (umifenovir) e losartana de potássio. Nenhum deles apresenta semelhança com o TCDO.

Os pesquisadores agora buscam recursos para importar o tetraclorodecaoxido, que não é registrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não sendo, portanto, vendido no Brasil. Em outros países, ele é comercializado com os nomes de Oxoferin, Macrokine e Immunokine. “Essa substância precisa ser manipulada para viabilizar os testes. Para isso, é preciso que este fármaco esteja disponível”, enfatiza o professor Marcos dos Santos. Nesta semana, ele submeteu projeto a uma entidade americana na tentativa de conseguir financiamento.

“Não fosse essa emergência toda, o processo demoraria mais. Temos indicações de que, em circunstâncias diferentes, essa nossa abordagem – baseada no uso de conceitos de máquinas de busca (Google, Yahoo etc.) – funciona”, conclui o professor Marcos Augusto dos Santos.

Pedido de patenteUso do tetraclorodecaoxido para produzir medicamentos para tratar pacientes com Covid-19
Data do depósito: 8 de abril de 2020
Titularidade: UFMG
Inventores: Professor Marcos Augusto dos Santos e Carmelina Figueiredo Vieira Leite (farmacêutica e aluna de doutorado)
Unidade: Instituto de Ciências Exatas / Programa Interunidades de Bioinformática